INFOMAUÁ Mauá
edição 117 - Outubro de 2020

O Profissional Eterno: Presente – Passado – Futuro

Compete à universidade do futuro proporcionar a seu estudante múltiplas experiências e oportunidades que vão além do conhecimento como ferramenta

O Profissional Eterno: Presente – Passado – Futuro                      

Por mais de 8 anos, temos atuado na Reitoria do Centro Universitário do Instituto Mauá de Tecnologia, uma entidade de direito privado – associação sem fins lucrativos – dedicada ao ensino e à pesquisa tecnológica. Lá temos liderado um processo de renovação dos cursos de graduação que não significa simplesmente um ajuste de grade de disciplinas, mas uma revisão da forma de se entender o currículo e a instituição, convergindo recursos humanos e de infraestrutura para criar oportunidades de desenvolvimento de competências para toda a comunidade de alunos e professores, devolvendo resultados relevantes para a sociedade. É assim que preparamos o profissional do futuro. Porém, antes de entrar em mais detalhes sobre isso, queremos compartilhar nossa visão sobre o futuro e as atitudes necessárias para trilhar o caminho da inovação.

O Futuro

Qualquer que seja a mudança, ela depende da atitude das pessoas. Enquanto alguns indivíduos são provocadores e incentivadores de movimentos de inovação, outros estão presos à estabilidade e impõem uma resistência tão grande que inviabiliza o progresso e fragiliza a organização, colocando em risco a prosperidade do negócio.

Na tentativa de entender melhor esses comportamentos e sua influência no processo de mudança, queremos trazer à tona uma breve discussão sobre Passado, Presente e Futuro. Do Passado trazemos nossas certezas, uma dimensão confortável dada pelo conhecimento que já temos e pelas experiências que vivemos. O Presente apresenta-nos o provável, permitindo que avancemos nas adjacências do nosso conhecimento, ampliando-o gradualmente. Embora viver o Presente represente por si só algum avanço, com o Passado ele integra o que chamaremos de Estabilidade[1] — não confundamos estabilidade com estaticidade.

O Futuro inevitavelmente desafia a Estabilidade e  oferece-nos a oportunidade da Mudança, que se apresenta de duas formas possíveis. Na primeira, o Futuro descortina-se aos poucos e mostra-se incerto, pois não temos como prever exatamente o resultado de uma ação ou de uma escolha — embora ela, a ação ou a escolha, seja normalmente influenciada pelo nosso conhecimento. Na segunda forma, o Futuro apresenta-nos o inconcebível. Trazendo esse modelo para o contexto da inovação, percebe-se a relação com o que se chamam inovações incrementais e disruptivas, respectivamente. As inovações incrementais acontecem quando as situações de exceção, que periódica e inevitavelmente surgem, desafiam o status quo e são devidamente analisadas, tratadas e aproveitadas para promover a evolução do modelo vigente. As inovações disruptivas, por sua vez, abrem mercados e demandas que não existiam — percebemos na atual situação de pandemia o perfeito exemplo.

O profissional do Futuro

O profissional que domina o instrumental tecnológico de sua área de atuação pode, ao limitar-se à Estabilidade, sucumbir apesar do seu conhecimento. É justamente na dimensão da Estabilidade (Passado/Presente) que reside o maior risco de substituição desse profissional por sistemas automatizados e algoritmos computacionais, por exemplo.

Obviamente não se chega ao Futuro sem Passado e sem Presente – Mudança e Estabilidade sempre coexistirão. O profissional do ou para o futuro navega entre a Estabilidade e a Mudança e compreende que seu grande diferencial está em enfrentar o Futuro, utilizando-se do conhecimento e da tecnologia, tanto na sua forma da incerteza quanto na do inconcebível. Para que a Mudança ocorra, seja qual for a forma de futuro que se apresentará, deve-se necessariamente abrir mão de parte da Estabilidade, o que requer um componente de atitude, muitas vezes denominado mindset de inovação. A Estabilidade constitui a zona de conforto, seja do profissional, seja da organização, e é natural que ela represente o componente de resistência. No entanto, sem abrir mão de alguma Estabilidade, não ocorrerá o movimento e a Mudança não passará de um discurso ou de uma vontade. Por que é tão difícil para alguns dar esse passo? Uma justificativa simplista iria levar-nos à afirmação de que é cômodo nada ceder para a Estabilidade, mas provavelmente todos nós conhecemos casos de profissionais que, embora brilhantes, também se veem presos na mesma armadilha. Entendemos que todos estão dispostos a abrir mão de parte da Estabilidade — seja ela uma tecnologia, uma estrutura organizacional, um conhecimento bem estabelecido, uma posição hierárquica —, contanto que isso não agrida sua essência. O Existencialismo, portanto, contribui para a compreensão da tensão que existe e sempre existirá entre a Estabilidade e a Mudança. O tal profissional do futuro tem uma postura favorável à mudança porque construiu uma atitude, uma essência durante toda sua existência, que compreende seu processo de formação. Essa postura não é, portanto, construída com um passe de mágica, uma palestra motivadora, nem de um livro de autoajuda. A educação superior pode e deve oferecer oportunidades para a construção dessa essência.

Compreendemos, então, que o profissional do futuro vive com um olhar atento às oportunidades que se revelam na sua trajetória para desafiar a Estabilidade e propor novas estratégias e soluções. No entanto, diante de cada vez mais complexidade dos sistemas e avanços da tecnologia, ele sabe ser impossível resolver os grandes problemas e encarar os grandes desafios sozinho. Por isso sabe, também, construir relações, estabelecer nexos e juntar diferentes atores, com componentes diversos de competências, para dirigir os processos de inovação.

A formação do Futuro

Se se espera do profissional do futuro uma atitude inovadora, é papel da formação superior contribuir para a transformação da essência do indivíduo. Compete à universidade do futuro, portanto,  proporcionar a seu estudante múltiplas experiências e oportunidades que vão além do conhecimento como ferramenta. Um curso superior, por isso, não deve ser visto simplesmente como um processo de aquisição de conhecimento.

Um currículo não pode ser entendido apenas como uma matriz de disciplinas com suas ementas e cargas horárias. E a Escola não é apenas um endereço onde há salas de aula e laboratórios bem equipados. A formação superior é composta por múltiplas e diversificadas experiências de aprendizagem e de desenvolvimento pessoal, em que o estudante é exposto a um ecossistema de oportunidades para adquirir competências e acumular vivências transformadoras da sua essência, das suas atitudes. Isso não significa diminuir, mas apenas relativizar, a importância do conhecimento científico e tecnológico adquirido na educação superior.

Os cursos do Instituto Mauá de Tecnologia passaram por importante processo de revisão curricular iniciado em 2015. A sala de aulas convencional continua um espaço importante no processo de formação, mas com o uso cada vez mais frequente e qualificado de estratégias ativas de aprendizagem, que colocam o estudante como protagonista do processo. Passamos a valorizar muito mais o que acontece fora da aula, estimulando o estudante a se envolver em problemas trans e interdisciplinares e a buscar ter experiências fora da sua área de formação principal. Atualmente, cerca de 15% da carga horária de integralização dos cursos de graduação da Mauá são em projetos e atividades especiais e muitas delas conduzidas por profissionais do mercado de trabalho, não pertencentes ao tradicional quadro docente da Instituição.

Ir na contramão da fragmentação do conhecimento é também um componente dessa transformação curricular do futuro. Para ser coerente com o que se espera do profissional do futuro, a universidade deve preparar os estudantes para inovar e resolver problemas complexos. Para tanto, deve promover o relacionamento com professores, profissionais e estudantes de várias áreas, trabalhando de forma colaborativa, enxergando os desafios por diversas perspectivas. Na Mauá, por exemplo, incentivamos a convivência dos estudantes de Engenharia, Administração e Design nos projetos, pois existe aí uma complementação essencial para promover a inovação: o engenheiro reforça a perspectiva da viabilidade técnica; o administrador,  a da viabilidade econômico-financeira e o designer tem seu principal foco no usuário do produto ou serviço. Se esses três elementos não forem simultaneamente bem satisfeitos não haverá a inovação eficaz.

A instituição de educação superior do futuro

A infraestrutura da instituição de educação do futuro deve refletir essa visão mais ampla do que seja um currículo. Os laboratórios não estão mais relacionados com disciplinas, mas com  áreas de conhecimento em que existe o estímulo à experimentação aberta em detrimento da execução de roteiros preestabelecidos. Quando se projeta a reforma ou construção de um laboratório na Mauá, procura-se atender a alunos de todos os cursos com a infraestrutura que ele oferecerá.

Para que seja capaz de servir à sociedade, a instituição deve promover constantemente oportunidades para a geração de conhecimento por meio da pesquisa, seja ela mais científica, seja mais aplicada, como é a que se incentiva no Instituto Mauá de Tecnologia. Para que o conhecimento gere valor, deve existir uma cultura extensionista de constante relacionamento com a sociedade. No caso de uma instituição como a Mauá, com vocação tecnológica, deve haver vínculos fortes e permanentes com a indústria. A necessidade inequívoca de coexistência equilibrada entre ensino-pesquisa-extensão é reafirmada na instituição de educação superior do futuro.

Considerações finais

O tema “profissional do futuro” é muito recorrente. Procuramos mostrar neste texto que nossa preocupação em preparar o profissional para o futuro não está só relacionada com a aquisição de conhecimentos, mas também com a transformação da essência do indivíduo e o desenvolvimento de suas competências socioemocionais. O ser humano e o profissional nunca ficam prontos. Trata-se de uma Eterna (Passado, Presente, Futuro) busca por tornar-se melhor. 

Prof. Dr. José Carlos de Souza Junior – Reitor e Prof. Dr. Marcello Nitz – Pró-Reitor do Centro Universitário do IMT.

Autores

Prof. Dr. José Carlos de Souza Junior
Reitor
Centro Universitário do Instituto Mauá de Tecnologia

 

Prof. Dr. Marcello Nitz
Pró-Reitor Acadêmico
Centro Universitário do Instituto Mauá de Tecnologia

[1] Os autores agradecem aos colegas Paulo Grise e Wladimir Palermo as reflexões sobre Estabilidade, Mudança e o Existencial nas organizações.

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